CARLOS ALVES
SURIYA
“MARYAM
(...)
Afinal
Foi assim
Uma guerra
Como outra qualquer
Uma guerra
E na guerra é assim mesmo
Acontece tudo
Perdemos tudo
ROSANA
Até mesmo a honra
Sobretudo a honra”
SURIYA é inspirado em factos ocorridos durante o conflito na Síria. Este é um texto de violência ou da violência que pode tornar-se espectáculo. Um espectáculo de instintos, num lugar de incompreensão, medo e intolerância. Nesse lugar, os instintos são um perigo, colocam o Ser Humano à beira do descontrolo total. Os instintos são uma arma.
Uma guerra, destroços e desejos de reconstruir. No meio da guerra, a festa, a alucinação, a loucura. A festa descontrolada, de instintos irracionais. São momentos em que a descompressão estimula o apetite sexual e o desejo de ferir. Há mulheres que são utilizadas como instrumento de diversão, de exercício de poder e um inimigo de guerra; mulheres que satisfazem os anseios de dominação, vingança, satisfação sexual e demonstração de força.
SURIYA mostra objectificação, sexualização, instrumentalização, violência física e psicológica sobre mulheres. Não só sobre as que estão presentes mas também sobre outras, que se encontram num outro lado do mundo. As outras que, estando ausentes, são lembradas e referidas pelas possibilidades sexuais com que são tidas em conta; essas que, na ausência, são violentadas pelos termos de comparação a que são sujeitas.
Aqui, a guerra exponencia a violência. Por outro lado, esta subsiste para além da guerra e existe antes dela. Esta guerra é, afinal, um espelho do mundo.
E do outro lado do mundo, assiste-se, pelos ecrãs, a imagens que perturbam, que se querem evitar mas não travar. Há uma ponte entre esse lugar chamado “Suriya” e o outro lado, que assiste, que acolhe e que recusa. No entanto, os dois lados estão sempre a olhar um para o outro como quem se vê ao espelho.
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INFORMAÇÃO ADICIONAL
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Escrito entre 2018 e 2019. Fez parte do projecto final de mestrado na Escola Superior de Teatro e Cinema. Neste contexto, foi criado um espectáculo com o mesmo nome e apresentado, em Maio de 2019, no Auditório da Biblioteca de Marvila, em Lisboa.